Quando comecei a andar de bicicleta inscrevi-me numa maratona de 40 Km, foi a minha primeira vez, assim que me inscrevi mil vozes se ergueram para me dizer que eu estava maluca, que 40 km faziam as pessoas experientes, que eu não devia ir, que eu não conseguia. Consegui. Pouco mais de um mês depois marquei a minha primeira viagem de bicicleta e logo mil vozes se ergueram para me dizer que 200 km eram impossíveis para mim, que eu estava maluca, fizeram-se apostas porque era uma realidade, eu não conseguia. Consegui. Meio ano depois quis aventurar-me a primeira vez e marquei a minha tão sonhada viagem pelo Caminho de Santiago, logo mil vozes se ergueram para me falar das dificuldades, para me falar da minha falta de preparação física, para me dizer que eu não conseguia. Consegui. O mais grave aconteceu quando em 2013 comecei a planear as minhas férias e comecei a preparar-me para O Caminho Francês de Santiago, mil vozes se ergueram para me dizer que agora sim, eu estava completamente maluca. 1000 Km de bicicleta? Impossível. E com alforges? Em autonomia total? E se me acontecesse alguma coisa? Que faria eu? Dormir em albergues? Partir de manhã de uma cidade sem saber exactamente onde se vai dormir à noite? E se não arranjasse local para pernoitar? Dormia na rua? E para chegar lá, tinha de levar a bicicleta desmontada? E para a montar? Se corresse alguma coisa mal? E as roupas? Tinha de levar pouquíssimas coisas, tinha de lavar todos os dias a roupa que queria usar dois dias depois? E se tivesse uma avaria na bicicleta? E se me perdesse? E se fosse assaltada? E se caísse? E se...? E se...? E se...? Eu consegui.
De cada vez que me quis aventurar se tivesse ouvido as mil vozes que se ergueram para me dizer que eu não conseguia, que eu não era capaz, que era demasiado perigoso, que eu estava maluca, que não compreendiam como eu ousava sequer sonhar com uma coisa assim, ainda que eu nunca tenha pedido opinião a nenhuma dessas pessoas que erguiam as vozes para me dizer que era impossível, se as tivesse ouvido, nunca teria saído de casa, nunca teria arriscado, nunca teria feito aquela que foi a viagem da minha vida. Estaria até hoje a andar de bicicleta à volta de casa como se fosse um ratinho amedrontado.
E se eu contrariei mil vozes negativas tantas vezes, e se eu pretendo continuar a contrariar quantas vozes, quantas vezes, se erguerem para me aclamarem com o impossível, quem sou eu para fazer o mesmo? Eu apoio as pessoas em tudo o que elas me dizem que querem fazer, eu digo sempre que sim, que conseguem, que são capazes, que façam e que aconteçam. Eu digo "força", faço um grande sorriso e ofereço ajuda para o que precisarem. Porque se eu acredito do fundo do coração que sou capaz de tudo, acredito de igual forma que os outros também são.
E às vezes os outros só precisam de ouvir uma voz positiva no meio das mil vozes negativas.
Março de 2015
Que texto incrível! Que bom que haja alguém, uma voz, assim.
ResponderEliminarpodia escrever algo tão parecido... saí de casa dos pais aos 19 anos para outro país sem trabalho "certinho", a quantidade de vezes que quis fazer algo (desde tatuar a trocar de casa, a deixar por varias vezes situaçoes de segurança/estabilidade pelo incerto, juntar-me e agora mais recente a ideia de tirar a carta e comprar casa ) e me disseram "és muito nova para isso, nao estás preparada, vai correr mal" e eu fui lá e fiz e sorri e acenei. como eu digo ao meu marido "vou seguir o exemplo de quem já foi la e fez, nao vou escutar nada de quem ainda está sentado no sofá de sempre"
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